quinta-feira, janeiro 16, 2025

20 discos de 1975 que adoro

 


Um amigo sempre me falou: a graça das listas é a pequena quantidade de obras dentro delas, que faz com que valorizemos as que entraram e lamentemos as ausentes. Outro amigo prefere as listas amplas, como as de 100 discos de 1977 ou de 1983 que fiz no melomania anos atrás. Bom, uma lista ampla de discos antigos requer muito mais trabalho, e mesmo uma de 100 daria espaço para uma série de injustiças. Desse modo, opto por uma lista menor, sabendo que as injustiças serão grandes, mas os presentes estarão bem salientados.

Lista é gosto pessoal, pura e simplesmente. Também no gostar ou não delas. Quem não gosta de fazer ou ler listas, não precisa entrar para xingar. Basta ignorar este post do melomania e os posts que o divulgarem nas redes sociais. É como fazem as pessoas civilizadas. Quem quiser me mandar sugestões entre as inúmeras obras que deveriam estar presentes, fique bem à vontade. Faz parte do jogo e é divertido que seja assim.

                                            * * * * *

Entendo 1975 como um ano de espera, em que alguns estilos que dominaram a primeira metade da década, como o prog rock e o glam rock, estavam em um impasse. Por outro lado, a disco music já se insinuava enquanto o soul e o funk estavam a milhão. E as fusões de jazz com o rock e com o funk praticamente dominaram toda a música mainstream dos anos 1970, até mesmo no Brasil. Talvez o jazz, em suas ricas matizes, foi para os anos 1970 o que as matizes da música eletrônica foram para os anos 1980. Penso que a lista final reflita exatamente isso.

 

DISCOS

01. Gilberto Gil – Refazenda

Provavelmente o disco mais impressionante lançado no Brasil em todos os tempos, ultrapassando os três ou quatro dos Novos Baianos que mereciam entrar nessa briga. Refazenda tem rock, jazz, xote, "lamento", música para "tocar no rádio" e o que mais quisermos classificar, em algumas das melodias mais belas que Gil criou.

02. Led Zeppelin - Physical Graffitti

The Lamb Lies Down on Broadway (Genesis), Songs in the Key of Life (Stevie Wonder) e You Are What You Is (Zappa) podem conseguir empate, mas nenhum outro álbum duplo supera esta pérola que o Led Zeppelin lançou em 1975, compilando músicas novas que dariam mais de um disco simples com algumas sobras do Led IV e do Houses of the Holy. Magnifico.

03. Frank Zappa and the Mothers of Invention - One Size Fits All

The Mothers era a banda de Zappa antes que a gravadora impusesse o "of invention", com que este discaço de jazz rock e progressivo é creditado. O LP surge logo após a série de álbuns mais radiofônicos (Overnite Sensation, Apostrophe, Roxy & Elsewhere), coroando uma fase extraordinária do músico, a que tem em suas fileiras o mago George Duke (que, por sua vez, lançou dois discos excelentes em 1975).

04. Black Sabbath – Sabotage

Disco que encerra a melhor fase da banda, que começa com Master of Reality para ao todo quatro discos impecáveis de metal pesado em sequência (e ainda lançariam o magnífico e injustiçado Never Say Die), Sabotage é aquele em que encontramos Ozzy no auge, com uma voz que penetra em nossos ouvidos como algum gás contagiante. Todas as faixas aqui se tornaram clássicas, das mais tradicionais às mais malucas. Se Vol.4 é o marco fundamental do stoner rock, este disco é o ápice do rock.

05. Jorge Ben - Solta o Pavão

Não é que 1975 foi um ano sensacional para a música brasileira. É que qualquer ano da década de 1970 foi sensacional para a música brasileira. Solta o Pavão, se não for o melhor disco de Jorge Ben (e isto quer dizer muito), é sem dúvida um dos três melhores. Imagino quantos não cantavam, em uníssono, ao verem Ben se aproximar de alguma roda: "O rei chegou, viva o rei".

06. Parliament - Mothership Connection

Em 1975, o Parliament (mais funk) e o Funkadelic (mais rock) estiveram próximos como nunca antes, ainda que as bandas continuem com suas identidades particulares sob a maestria de George Clinton. Enquanto o Parliament lançava seu melhor disco, Mothership Connection, Funkadelic lançou um disco menor (Let's Take it to the Stage) após a obra-prima Standing on the Verge of Getting it On, de 1974.

07. Queen - A Night at the Opera

Terceiro de uma trinca perfeita da banda, iniciada com Queen II e continuada com Sheer Heart Attack. Talvez esteja aqui a faixa mais impressionante composta por Freddie Mercury: "Death on Two Legs". "'39" é a culminação dos flertes de Brian May com a música americana e "The Prophet's Song" é mais uma obra-prima de sua lavra com o Queen. E quem diz ter enjoado de "Bohemian Rhapsody", sinceramente, nunca gostou de verdade da música (ou "de música"?).

08. Brian Eno - Another Green World

Terceiro disco de Eno, em pé de igualdade com os dois primeiros, já se insinuando nos caminhos que Eno trilhará a seguir, algo entre o rock e a ambient music já bem definida no disco Evening Star, creditado a Eno e Fripp, que seria lançado no fim do mesmo ano.

09. Earth & Fire – To the World of the Future

Num ano cheio de belos discos de progressivo que bateram na trave (certamente numa lista de discos de 1974 e, principalmente, de 1973 ou 1972, teria mais discos de prog), este da banda holandesa é pop demais para agradar os proggers mais radicais (e bobos, eu diria) e progger demais para agradar aos mais poppers. É o mesmo problema enfrentado por outra banda holandesa, o Kayak. Azar de quem tem esses preconceitos, pois são duas grandes bandas.

10. Smokey Robinson – A Quiet Storm

O terceiro disco solo de Smokey é um compilado involuntário de melodias celestiais, ou seja, uma coletânea involuntária com algumas canções do nível das melhores que ele escreveu com sua antiga banda, The Miracles. Baladas soul e músicas de apelo pop com arranjos delicados, sofisticados e muito bem produzidos.

11. Fela Kuti – Excuse-O

O nigeriano Fela Kuti lançava vários álbuns por ano, quase sempre com um grande nível de excelência, sobretudo nos anos 1970. Este disco meio que representa vários outros que o músico gravou no mesmo ano com sua banda Afrika '70 e poderiam estar aqui. Um gênio do chamado afrobeat.

12. Electric Light Orchestra - Face The Music

Eldorado, de 1974, talvez seja o disco em que eles acertam a fórmula pela primeira vez, deixando que as melodias compostas por Jeff Lynne brilhem sem a concorrência de inspirações psicodélicas herdadas do Move e de Roy Wood. Neste quinto LP, eles continuam no mesmo caminho e o aperfeiçoam. Graças a eles, criei um subgênero bem particular, que utilizo de vez em quando: o pop perfeito.

13. Moraes Moreira – Moraes Moreira

Com a saída de Moraes dos Novos Baianos, os admiradores do grupo ganharam duas carreiras maravilhosas, pelo menos nos anos 1970, pois a banda continuou excelente sem Moraes, lançando, já em dezembro de 1974, o magistral Vamos pro Mundo, e Moraes iniciou uma maravilhosa carreira solo com este disco e lançaria outras maravilhas até, pelo menos, 1981.

14. Gentle Giant - Free Hand

Digamos que entre vários discos da lista que incluem inspirações do rock progressivo em algumas faixas, este é o único que pode ser chamado de progressivo sem maior crise. Um discaço cheio de inspirações melódicas e quebradas jazzísticas de uma banda até hoje subestimada.

15. Ohio Players – Honey

Entre 1974 e 1976 esta banda de soul e funk lançou quatro discos essenciais, todos com capas sensuais e hoje censuradas no Rate Your Music. Este Honey, único de 1975 e com o maior sucesso deles, "Love Rollercoaster", talvez seja o ponto culminante.

16. Bee Gees – Main Course

"Nights on Broadway", sozinha, já seria o bastante para colocar este disco em qualquer lista. Mas tem muito mais nesta pérola pop-dançante que abria as portas para a disco music e para o falsete de Barry Gibb brilhar.

17. Alphonse Mouzon – Mind Transplant

Em 1974, Mouzon tocou bateria no explêndido primeiro disco da Eleventh House de Larry Coryell. Em 1975, ele tocou no segundo disco da banda de Coryell, que é ligeiramente inferior (o que significa que ainda é muito bom), mas lançou também este seu terceiro disco solo, um magnífico petardo de quebradeira jazz-rock que ganhou 1 estrela da revista Rolling Stone da época (que às vezes parecia revista de humor). Dois guitarristas sublimes participam do disco: Lee Ritenour e Tommy Bolin. Jazz e rock unidos também nas guitarras do disco.

18. Earth Wind & Fire - That's the Way of the World

O sexto disco desta banda mágica tem "Shining Star" e "Reasons". Precisa mais? Pois tem. E muito mais. Obrigatório, como tudo que a banda fez entre 1971 e 1981.

19. 10cc – The Original Soundtrack

Terceiro e mais famoso disco da excelente banda de art rock inglesa. É deste LP o maior sucesso da banda, "I'm Not in Love". No ano seguinte, ainda lançariam o magistral How Dare You!, último com a formação clássica.

20. Robert Wyatt – Ruth is Stranger Than Richard

Brilhante sequência para o magistral Rock Bottom, este disco tem participação de Brian Eno em algumas faixas, e dois lados diferentes, o lado Ruth e o lado Richard, um mais malucão que o outro, como o próprio título indica.

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+ 12 discos, porque sim

Patti Smith – Horses

Primeiro discaço da diva punk.

Invisible – Durazno Sangrando

Sublime prog argentino da família Spinetta.

Harmonium – Si on Avait Besoin d'une Cinquième Saison

Segundo e melhor LP da belíssima banda prog de Quebec.

Bob Dylan – Blood on the Tracks

Este e Desire (de janeiro de 1976) formam uma dupla essencial.

Mahavishnu Orchestra - Visions of the Emerald Beyond

Seleção de músicos do jazz rock e um de seus melhores discos.

Caetano Veloso - Qualquer Coisa

O outro lado é jóia. Este é mais jóia ainda.

Hawkwind – Warrior on the Edge of Time

Último disco da banda com Lemmy Kilmister. Clássico do space rock.

The Pointer Sisters – Steppin'

Rumo a um pop soul tão bom quanto o jazz que faziam anteriormente.

Renaissance - Sheherazade and Other Stories

Só "Ocean Gypsy" já vale o disco. E ainda tem a suíte que o intitula.

Rufus – Rufus featuring Chaka Khan

Funk na cabeça, com a voz maravilhosa de Chaka Khan.

Kayak – Royal Bed Bouncer

Pop demais para os proggers, prog demais para os poppers.

Split Enz – Mental Notes

Proto new wave da Nova Zelândia.


quarta-feira, dezembro 27, 2023

Marillion revisitado - Parte 2

 


Esta parte do especial Marillion cobre a primeira parte da fase Steve Hogarth, que se tornou muito maior e duradoura do que a fase Fish. Passaremos pelos últimos discos com a EMI e pelos três discos do contrato com a Castle, pela guinada pop, pela volta ao progressivo e por uma tentativa de balancear melhor as duas tendências introduzindo, aos poucos, outros estilos.

Seasons End (1989) * * *1/2

Com a saída de Fish e a entrada de Steve Hogarth, o Marillion deu um passo largo na direção do comum. A estranheza de Fish, mesmo que fosse parecida com a de Peter Gabriel, era um ingrediente importante para a banda. Natural então que o fã se decepcionasse um pouco com este novo disco e um vocal mais dentro dos conformes do neoprog. Essa nova formação só encontraria sua melhor face no terceiro disco, Brave, de 1994. Mas é inegável que o instrumental e a produção aqui encontram um nível jamais alcançado anteriormente. E Hogarth é menos estrela, o que faz a banda ficar mais coesa, com os músicos todos um pouco mais em igualdade perante os fãs. A levemente pop "The Uninvited Guest" e a esplendorosa "The Space" são os maiores destaques, mas "Easter" e "Berlin" são belos achados de arranjo e melodia. Em compensação, penso que nunca foram tão longe no pop como em "Hooks in You". Pena que não deu muito certo.

Holidays in Eden (1991) * * 1/2

O disco mais comercial do Marillion até então quase representou a falência artística da banda. Era para isso que Hogarth entrou? Cada faixa mais desafiadora - "Spiltering Heart", "The Party" - é contraposta por uma constrangedora, para uma banda que ainda estava associada ao progressivo - "Cover My Eyes", "No One Can". Este é o lado A. O lado B é melhor, mas não redime a porção exageradamente pop do disco. Até tem umas comerciais de bela melodia, como "Dry Land" ou "This Town", mas no geral é um passo em falso, não por ser pop, mas por ser pop pouco inspirado. Se era para tentar tocar mais no rádio, que caprichassem nas composições. Ouça marillion.com, de 1999, para comparar.

Brave (1994) * * * *

Disse Hogarth que perceberam o erro no disco anterior e deram uma guinada de 360 graus. Apesar desse sentimento do músico, Brave não é o disco mais arriscado que gravaram. Ao contrário, parece retomar o caminho iniciado com Seasons End, atenuando a faceta pop que Holidays in Eden exacerbava. As músicas voltaram a ser, em alguns casos, suítes, como em Misplaced Childhood. A maior delas, "Goodbye to All That", também a melhor faixa do disco, dura mais de 12 minutos e tem cinco partes. Talvez a banda tenha percebido o sucesso do prog-metal d Queenryche em Empire e decidido que poderia fazer um disco mais robusto, não bem prog-metal, mas certamente um prog mais estrondoso. Fizeram com isso um belo disco.

Afraid of Sunlight (1995) * * * *

Os três anos que separam Brave de seu antecessor dizem muitas coisas, mas não tanto quando o curto espaço de tempo entre Brave e Afraid of Sunlight. Este último flagra a banda ousando mais ainda, buscando novas sonoridades além de seu prog baladeiro, mas sem sair da trilha aberta com o disco anterior. Um crítico da Q definiu assim a mistura: toques do legado de Brian Wilson, Todd Rundgren e Beatles, com notas das trivialidades experimentais de Jellyfish e Split Enz. Pior é que faz sentido, mas em poucas faixas. Como "Cannibal Surf Babe", cruzamento inusitado entre Beach Boys, Split Enz e Can, uma das composições mais ousadas da banda, no sentido de desafio aos fãs, e também a melhor do disco. "Beautiful" é um dos maiores sucessos da banda, o tipo de balada melosa que eles tentam fazer desde Clutching at Straws. Desta vez acertaram em cheio. Entre as demais, a mais bela me parece ser a faixa-título, melodia bem marilliana, balada prog de respeito. As duas faixas acrescentadas no relançamento de 1999, "Icon" e "Live Forever" são estupendas, belos exemplos de experimentação que engrandecem o disco original.

This Strange Engine (1997) * *

"Man of a Thousand Faces" é a pior faixa de abertura de qualquer disco do Marillion até então. Menos por ser uma balada comercial levada por violões e teclado, mas pela melodia um tanto óbvia e genérica. A segunda, "One Fine Day" segue o mesmo padrão, sendo só um pouco melhor. Na terceira, "80 Days", o nível volta a cair. A esta altura, precisaria melhorar muito nas cinco faixas restantes para que o disco fosse meramente satisfatório. A quebra com a EMI e um novo contrato para três LPs com a Castle deve ter mexido inicialmente com a inspiração da banda, que aqui soa como um daqueles pops genéricos dos anos 1990. Uma banda irreconhecível na maior parte do disco. Salvam-se, ainda que em degraus abaixo dos destaques de discos passados, "Estonia" e a faixa-título, único prog do disco, com 15 minutos e um arranjo que inclui solo de saxofone. Belo encerramento para disco que abriu mal e assim continuou por boa parte de sua duração. Felizmente, eles voltariam a fazer belos discos logo em seguida.

Radiation (1998) * * * 1/2

Bem mais desafiador que o disco anterior. Radiation flagra uma banda de espírito renovado, com desejo de seguir sempre em frente, sem se acomodar. "The Answering Machine" é uma das melhores composições da fase Hogarth. "Three Minute Boy" é uma das mais belas. "A Few Words for the Dead" é a prog gigante (mais de 10 minutos) que eles sempre fizeram muito bem. Por mais que o disco caia exageradamente nas baladas a partir da quarta canção, as melodias continuam inspiradas como nas três primeiras, o que faz a diferença.

marillion.com (1999) * * * *

Terceiro e último disco do contrato com a Castle que se seguiu à saída da EMI, este belo trabalho de nome contemporâneo contempla uma banda que já se tornou rainha na confecção de um pop radiofônico e moderno, ajudados pela tendência dos anos 1990 de um pop mais pesado, próximo do metal. Com outro belo álbum em sequência, e este me pareceu ainda melhor que Radiation, eles praticamente se redimem do fiasco de This Strange Engine. A primeira música, "A Legacy", é uma boa amostra disso, e é das melhores do disco - embora seja das menos ouvidas, segundo as estatísticas do YT music. "Deserve" segue a mesma tendência, com uma levada bem moderna e agradável. É outra das melhores. "Rich" é outra das menos tocadas no YT e é bem pop FM, para ver como o Marillion não se dá bem com essas relações óbvias. "Tumble Down the Years" é pop perfeito, uma bela melodia. Aprenderam essa arte muito bem. O disco se encerra com duas faixas enormes. "Interior Lulu", cheia de variações, é melhor, mas "House", que parece saída de algum disco solo do Sting, também é notável.

segunda-feira, dezembro 04, 2023

Marillion revisitado - Parte 1


Gostava muito de Marillion entre 1987 e 1988, o suficiente para lamentar a saída de Fish. Com a entrada na faculdade, na segunda metade de 1989, passei a ouvir outras coisas (sem abandonar o progressivo, mas abandonando um pouco o Marillion). Eventualmente ouvia uma música ou outra com carinho, mas a paixão não existia mais. Até este ano, quando resolvi seguir a sugestão do algoritmo do You Tube e ouvir o primeiro disco deles. Boom, o disco bateu em mim de uma forma que nunca havia batido. Nem mesmo em 1987, quando o ouvi pela primeira vez. Resolvi fazer uma retrospectiva cronológica, inicialmente pulando os discos ao vivo (talvez eu retorne a eles no final). Esta é a primeira parte do ciclo de reaudições, com a fase Fish. Aproveito para ressuscitar o Melomania.

 Script for a Jester's Tear (1983) * * * *

Belíssimo disco de estreia calcado em algum virtuosismo prog com lindas melodias. Lembro que meu disco vinha com o selo de aprovação da FM Fluminense. Os destaques vão para a faixa-título e para a estupenda "Chelsea Monday".

Fugazi (1984) * * * 1/2

Um som de lata atrapalha um pouco a beleza do disco, que continua na pegada de Script for a Jester's Tear, abrindo-se um pouco mais ao pop. O lado B é superior em tudo, principalmente por causa de "Incubus". Mas "Punch and Judy", a segunda do lado A, é irresistível e entrega um pouco das raízes punks da banda.

Misplaced Childhood (1985) * * * * 1/2

O maior sucesso da banda, com o hit arrasa-quarteirão "Kayleigh". O melhor momento é o clímax com a "Bitter Suite", quando as ambições progressivas da banda se manifestam em melhor forma. E ainda tem a fenomenal "Childhood's End?", uma das melhores composições da banda. Por ter menor duração que os discos anteriores, a impressão de que passa rápido demais é ainda maior.

Clutching at Straws (1987) * * * * 1/2

Sendo bem coerente com sua condição de continuadores do Genesis, Fish, o cantor, sai da banda após aquele que poderia ser comparado ao The Lamb Lies Down on Broadway do Marillion. A banda conseguiria grandes trunfos com Steve Hogarth, mas algo mágico se perdeu quando os falsetes de Fish pararam de encontrar a guitarra melódica de Steve Rothery e o teclado à Tony Banks de Mark Kelly. Sorte que ainda lançaram este disco magnífico para celebrar essa incrível reunião de músicos na contramão do som que reinava em sua época. Destaques para "That Time of the Night", "Torch Song" e "Slàinte Mhath". Mas na verdade o disco só tem duas músicas que não são estupendas, justamente as que impedem as cinco estrelas: "Incommunicado" e "Sugar Mice", ambas "só" boas.

B Sides Themselves (1988) * * * *

Coletânea de sobras que tem classe e qualidade para ninguém botar defeito. "Lady Nina" é um assombro de melodia e conceito. Na última audição, me reconciliei com "Grendel", essa cópia de "Supper's Ready" que consegue emocionar mesmo sendo derivativa, pela qualidade da melodia (ouçam o solo de "Alexander The Great", do Iron Maiden, para uma relação curiosa). Bandas cujas sobras são boas assim não se encontram facilmente.

domingo, janeiro 28, 2018

Porcupine Tree



Resolvi dar nova chance a essa banda inglesa liderada pelo multi-instrumentista Steven Wilson. Quando eu tinha loja, lembro de ter escutado Signify e Lightbulb Sun, e pelo menos o segundo me soou bem comum à época. Como não tinha visto nada demais, e como tinha lido de muita gente que Lightbulb Sun era o melhor disco deles, desisti de ouvir qualquer outra coisa (me esquecendo do ódio que críticos costumam ter com qualquer coisa que se aproxima de rock progressivo).

Ou seja, ouvindo na ordem cronológica, é possível perceber que até então Lightbulb Sun é o disco mais fraco deles, o único que cai após vários discos diferentes entre si, mas de equivalente valor musical, a meu ver. Porque ao tornar-se pop, enterrando quase totalmente o space rock e as viagens floydianas do passado, o Porcupine Tree tornou-se também uma banda comum, a despeito de uma ou outra boa (e até ótima) melodia, como "Where We Would Be" e de uma insinuante faixa como "Hatesong". O que, no balanço geral, constrói um bom disco, mas claramente inferior a todos que eles tinham feito antes.

Depois desse disco começa a chamada fase metal da banda, o que nada mais é, ao menos se considerarmos somente o disco seguinte, In Absentia, que o mesmo tipo de material mais pop de Lightbulb Sun com uma guitarra mais pesada de vez em quando. Em alguns momentos, nada que um OK Computer já não tivesse mostrado com melhor desenvoltura e composições mais fortes. Em outros, o passado de atmosferas espaciais mostra-se não totalmente enterrado e engrandece composições como "3" ou a prog-metálica "The Creator Has a Mastertape". Há, claro, outros ótimos momentos de prog metal, como na instrumental "Wedding Nails" e sua guitarra desafiadora. É a melhor faixa do disco. E é melhor que quase tudo feito pelo Dream Theater (banda que é sempre lembrada quando se fala de prog-metal).

Deadwing, o disco seguinte, confirma a adesão ao prog metal. É mais pesado que o anterior, refletindo a aproximação de Wilson com a banda Opeth e sua admiração pelos Nine Inch Nails. Fear of a Blank Planet, tido como um retorno à fase anterior, é novamente um prog metal de inspiração Queensrychiana (e nos piores momentos, Fateswarningiana), no qual se destaca a faixa de encerramento, "Sleep Together". No disco seguinte, The Incident, eles voltam a pensar em temais mais complexos, mudanças climáticas mais sensíveis, ainda que a orientação dos últimos discos não tenha sido completamente negada. De todo modo, este último LP, lançado pela banda no final da década passada, é o melhor que fizeram no século 21. E pelo menos uma música, "Time Files", com seus 11 minutos, rivaliza com as suites dos anos 90.

Nada tão desafiador, contudo, quanto o que eles produziram de On the Sunday of Life, o primeiro LP, quando Porcupine Tree era praticamente uma banda de apoio para as ideias visionárias de Steven Wilson, até Signify, o quarto LP que, reouvido agora, soa muito mais forte do que quando o conheci. Curiosamente, a melhor faixa de toda a carreira da banda talvez seja justamente uma dessas guinadas para um som mais palatável. Trata-se de "Stars Die", lançada como single na Inglaterra e presente em LP apenas na versão americana de The Sky Moves Sideways, o ótimo terceiro disco da banda. Wilson, ao menos no Porcupine Tree (sua carreira solo ainda precisa ser ouvida), parece melhor quando se abre esporadicamente ao pop do que quando o abraça mais plenamente.

On the Sunday of Life (1992) * * * *
Up the Downstair (1993) * * * *
The Sky Moves Sideways (1995) * * * *
Signify (1996) * * * *
Stupid Dream (1999) * * * 1/2
Lightbulb Sun (2000) * * *
In Absentia (2002) * * *
Deadwing (2005) * * *
Fear of a Blank Planet (2007) * * *
The Incident (2009) * * * 1/2

quinta-feira, janeiro 11, 2018

Patto



Com quatro discos lançados, a banda inglesa Patto, um dos patrimônios do selo Vertigo em sua fase mais prestigiada, a da espiral, moveu-se de um jazz-rock movido ao básico voz-baixo-guitarra-bateria, com eventuais incursões pelo vibraphone, visto no primeiro LP Patto (1970) para um rock suingado e funkeado que atinge sua formatação decisiva no terceiro disco, Roll'em, Smoke'em, Put Another Line Out (1972). São dois discos essenciais para quem gosta de rock com pitadas generosas de jazz, soul e blues.

Como sou fascinado por discos de transições, não tenho como considerar o segundo deles, Hold Your Fire (1971), outra coisa que não a obra-prima do grupo. Pensando bem, é fácil chegar a essa conclusão, visto que os outros discos têm uma irregularidade, pontas soltas e momentos desnecessários ou mesmo mais fracos, que Hold Your Fire não tem. Ouvindo esse disco comigo, nos anos 90, quando conhecemos a banda, meu irmão observou que Ollie Halsall toca guitarra como se fosse um saxofone, e é verdade. É em Hold Your Fire, mais ainda que no incrivelmente jazzístico primeiro disco, que a influência de Hot Rats (o LP do Zappa tido como inaugural do jazz rock junto com In a Silent Way, de Miles Davis e alguns outros discos menos famosos) parece mais evidente. Halsall deixa sua guitarra percorrer caminhos sinuosos com rapidez, puxando o restante da banda e mostrando um incrivel entrosamento entre ele e o vocalista Mike Patto. É desse disco a minha preferida da banda, e uma espécie de portfolio do que pode Halsall quando inspirado: "Give it All Away".

Em Roll'em, já pela gravadora Island, Halsall às vezes parece mais interessado no piano do que na guitarra, como podemos ver já na excelente faixa de abertura "Flat Footed Woman" ou na igualmente excelente "Turn Turtle", duas das melhores faixas do disco. "Loud Green Song", por sua vez, é um rockão sujo, com baixo jazzístico e guitarra aceleradíssima, como a de um Alvin Lee. É um disco bem solto, como o primeiro, ainda que isso provoque bobagens como 'Mummy" e "Cap'n P' and the Attos". É também mais sujo e mais para o blues e o soul do que para o jazz, se é que dá para separar assim facilmente as influências ouvidas. A melhor do disco é "Singing the Blues on Reds", que de certo modo explica melhor o que tentei dizer acima, ao mesmo tempo em que mostra que a banda estava indo por outros caminhos.

O que era para ser o quarto disco, Monkey's Bum, gravado em 1973, foi engavetado e só veio à luz em 2002 por cortesia da gravadora Akarma, com produção mais tosca que o usual porque a banda havia se desmanchado, deixando a Island com liberdade para então cancelar o lançamento. Não é um mau disco, mas carece mesmo de acabamento. Até para os padrões sujos do terceiro disco. Dá para ouvir a guitarra de Halsall a mil, como sempre, alguns instrumentos de sopro que ficaram sem crédito provavlemente por falta de pesquisa por parte da Akarma, e é possível perceber que a banda tentava voltar ao nível de excelência de Hold Your Fire. Pena que ficaram no meio do caminho.
Patto foi para o Spooky Tooth, banda que sempre considerei superestimada dentro desse contexto de rock obscuro setentista, e depois formou o Boxer, com um bom primeiro disco e outros dois discos mais modestos. Halsall tocou em alguns discos do genial Kevin Ayers, e pode ser visto num dueto sensacional com Andy Summers em um show do Kevin Ayers de 1983 (Halsall com um roupão rosa).

Patto (1970) * * * *
Hold Your Fire (1971) * * * * *
Roll'em, Smoke'em, Put Another Line Out (1972) * * * 1/2
Monkey's Bum (1973 – 2002) * * *

terça-feira, novembro 07, 2017

Todd Rundgren em 1975 e 1976



Foi um período difícil para Todd Rundgren o miolo dos anos 1970. Ele que já havia mostrado um talento quase inigualável como compositor desde os primeiros discos com o Nazz, e explodiu definitivamente com três discos impecáveis feitos em sequência – Something/Anything (1972), A Wizard: A True Star (1973) e Todd (1974) -, respectivamente o terceiro, quarto e quinto discos solos de sua carreira, parece ter entrado em parafuso após este último. Após a gradual complexificação de seu pop/rock orientado para canções, operação que confundiu os críticos que gostariam de mais Something/Anything. Para onde ir agora? – é o que devia se perguntar Todd à época da ressaca de Todd.

A resposta inicial foi montar uma nova banda, a exemplo do que fez Paul McCartney dois anos depois de sair dos Beatles. Utopia seria essa banda, e teria a proposta de responder ao som do momento de maneira criativa, ou seja, expandindo uma vertente específica daqueles tempos, no caso, o rock progressivo. Por mais que o primeiro disco desse projeto seja muito inferior ao trabalho solo de Rundgren até então, havia ali qualquer coisa do gênio a que estávamos acostumados.

Isto é algo praticamente ausente de Initiation (1975), com o qual deu prosseguimento à carreira solo. Meio prog, meio místico, meio disco, esse disco insólito tem mais de uma hora de duração, em um único disco de vinil (imagine a fragilidade da mídia física, com os sulcos todos esprimidos para que caibam todas as músicas), uma porção de boa música junto de algumas bobagens e nada, absolutamente nada que fizesse jus à grandeza desse músico.

Pior é o disco seguinte, Faithful, lançado após um disco ao vivo do Utopia, em 1976. Com o primeiro lado só de covers, Todd Rundgren desceu onde nunca havia descido em sua carreira. Primeiro pelas escolhas, óbvias. Depois pela falta de imaginação nas versões, que em nada acrescentavam às suas originais. O lado B, só de composições próprias, é bem melhor (embora longe da excelência do período 72-74), mas o estrago estava feito.

Sua carreira, felizmente, entraria nos trilhos em 1978, quando, após dois bons discos do Utopia – RA e Oops Wrong Planet, ambos de 1977 – ele lança mais um ótimo disco solo de pop-rock (quase tão bom quanto o mais aventuroso Todd). Hermit of Mink Hollow é o nome do disco, que contém faixas mais curtas e simples, e vem com o hit "Can We Still Be Friends".
 
P.S. Sempre esqueço de colocar The Ballad of Todd Rundgren (1971), seu segundo disco solo, no lugar que lhe é devido: o de obra-prima absoluta. Ou seja, são quatro discos impecáveis em sequência ali na primeira metade dos anos 70.



domingo, setembro 10, 2017

Cotações ELOY


Volta o blog, voltam também as cotações. Como não acrescentei no post anterior, e como resolvi reouvir a maior parte dos discos comentados, aqui vai uma série de cotações atualizadas para os álbuns da banda até 1984, com breves comentários. Boa viagem.

Eloy (1971) **
Hardão genérico que lembra milhares de discos da época.
Inside (1973) ****
Frank Bornemann resolve levar seus cúmplices ao espaço e isso faz muito bem à banda. As faixas continuam grandes, mas agora os arranjos fazem toda a diferença. Na linhagem kraut-rock espacial que Jane, Novalis e Holderlim iriam perseguir adiante.
Floating (1974) ****1/2
Um aprimoramento do progressivo pesado e espacial apresentado no disco anterior, e forte candidato a segundo melhor álbum da banda. Peso, viagem, melodia, tudo em ótimas camadas sonoras.
The Power and the Passion (1975) ****
Talvez seja o primeiro disco com a sonoridade típica do Eloy mais conhecido, e também o primeiro com o conhecido logo e o mesmo padrão de capa com paisagem que será repetido em Dawn.
Dawn (1976) *****
É de fato a obra-prima da banda. Um dos discos mais variados de sua fase progressiva, com vozes estranhas invadindo o som espacial e melodias verdadeiramente pacificadoras.
Ocean (1977) ***1/2
Lado A magnífico, lado B genérico em tudo. Estava na hora de uma nova reformulação da sonoridade, sob o risco de se repetir. O que eles fizeram em seguida, após o burocrático ao vivo, foi um meio termo cômodo, mas que deu certo.
Live (1978) ***
Burocrático mesmo. E duplo ainda por cima. Claro, as músicas são boas, então o disco sobrevive.
Silent Cries and Mighty Echoes (1979) ****1/2
Percebe-se aqui que o clima fica um pouco menos viajante e mais palatável para um público oitentista.  Como já havia dito, este disco antecipa em muito o neo-prog que seria assumido pelas bandas inglesas da década seguinte, ao menos a boa porção delas (Marillion, Pallas), infelizmente minoritária.
Colours (1980) ****
Entram de sola nos anos 80 completando a transição iniciada no disco anterior e preparando o terreno para a crescente modernidade eletrônica dos discos que viriam. É o British Steel do Eloy (em alusão à obra-prima do Judas Priest que forjou a identidade oitentista da maior banda da NWOBHM).
Planets (1981) ****
Outro belíssimo disco com sonoridade moderna e ainda mantendo os dois pés no progresssivo. A capa do lançamento britânico é muito mais bonita (pode ser vista aqui)
Time to Turn (1982) ***1/2
Cai um pouco, mas não o suficiente para desanimarmos, ainda mais porque a faixa de abertura, "Through a Somber Galaxy", é arrasadora, com o baixo de Klaus-Peter Matziol embalando a melodia. Em todo caso, o Eloy fez a transição para os anos 80 um pouco melhor que o Camel, que nesse mesmo ano lançava o mediano A Single Factor.
Performance (1983) ***1/2
Mais moderno ainda, de um modo perigoso, mas surpreendentemente forte em retrospecto. Acho que foi o terceiro álbum que ouvi da banda, logo após de conhecê-la com The Power and the Passion e Dawn. Envelheceu bem esse disco cuja existência parece possível unicamente nessa primeira metade dos anos 80.
Metromania (1984) ***
Ainda mais modernoso que Performance, a ponto de talvez ser um tanto forçado chamar de progressivo. New Wave espacial seria mais apropriado.
 


quinta-feira, setembro 07, 2017

Eloy




Lá vou eu novamente ser do contra. Não por querer, mas por acontecer mesmo. É que nunca entendo essa quase unanimidade com relação ao Ocean (1977) ser o melhor disco do Eloy. Para mim, pelo menos três discos deles são melhores: Power and the Passion (1975), Silent Cries and Mighty Echoes (1979) e, acima de todos, o maravilhoso Dawn (1976), único postulante a obra-prima dos discos da banda.


Acho o lado 1 de Ocean extraordinário. O que quer dizer que de suas quatro músicas, as duas primeiras são muito boas. Já as duas últimas me parecem genéricas, algo criado por algum computador com informações genéticas do Eloy. Dawn, ao contrário, é inteiramente forte. Mais variado e nada monocórdico, cheio de melodias belas e empolgantes passagens instrumentais. É tão superior a Ocean, a meu ver, que desconfio que muitos elegem este último no piloto automático, sem ter se dado ao trabalho de ouvir as pérolas que compoem Dawn, das maravilhosas partes "Appearance of the Voice/Return of the Voice" à primeira "Lost", passando por "The Sun Song", "The Midnight Fight/The Victory of Mental Force" e Gliding Into Light and Knowledge", são mesmo muitas peças inspiradas de prog-rock, com uma força que eles nunca mais repetiriam.

A trinca Colours (1980), Planets (1981) e Time to Turn (1982), embora não tenha a qualidade de Silent Cries and Mighty Echoes, o álbum que fecha os anos 70 e já aponta para o neo-prog que iria despontar nos 80 (ouça "Master of Sensation" e entenda meu ponto), eu sempre achei interessante. Acho que a banda soube passar de suas influências floydianas para um som mais balançante, próximo do neo-prog, mas com maior inspiração. É em Performance (1983) que a coisa começa a ficar complicada. É um disco que tem seus momentos. A música que a Globo usou em seus documentários ("Shadow and Light") tem força. Mas já desperta um certo cansaço, ao contrário dos anteriores, que rolam bem do começo ao fim. Metromania (1984) é um pouco melhor. Nunca escutei o que veio depois, com a exceção do Ocean 2 (1998), que na época me pareceu bem fraco.

P.S. Reouço Performance e me surpreendo. É mais um disco legal da banda, com sete boas composições. E menos pop modernoso do que eu lembrava, talvez porque agora gosto de muitas coisas que são pop modernoso, então não me incomoda mais essa mistura de progressivo com a sonoridade eletrônica-cafona da época. Para melhorar, a capa faz alusão a um jogo de sinuca.