Esta parte do
especial Marillion cobre a primeira parte da fase Steve Hogarth, que se tornou
muito maior e duradoura do que a fase Fish. Passaremos pelos últimos discos com
a EMI e pelos três discos do contrato com a Castle, pela guinada pop, pela
volta ao progressivo e por uma tentativa de balancear melhor as duas tendências
introduzindo, aos poucos, outros estilos.
Seasons
End (1989) * * *1/2
Com a saída
de Fish e a entrada de Steve Hogarth, o Marillion deu um passo largo na direção
do comum. A estranheza de Fish, mesmo que fosse parecida com a de Peter
Gabriel, era um ingrediente importante para a banda. Natural então que o fã se
decepcionasse um pouco com este novo disco e um vocal mais dentro dos conformes
do neoprog. Essa nova formação só encontraria sua melhor face no terceiro
disco, Brave, de 1994. Mas é inegável que o instrumental e a produção
aqui encontram um nível jamais alcançado anteriormente. E Hogarth é menos
estrela, o que faz a banda ficar mais coesa, com os músicos todos um pouco mais
em igualdade perante os fãs. A levemente pop "The Uninvited Guest" e a
esplendorosa "The Space" são os maiores destaques, mas
"Easter" e "Berlin" são belos achados de arranjo e melodia.
Em compensação, penso que nunca foram tão longe no pop como em "Hooks in
You". Pena que não deu muito certo.
Holidays
in Eden (1991) * * 1/2
O disco mais
comercial do Marillion até então quase representou a falência artística da
banda. Era para isso que Hogarth entrou? Cada faixa mais desafiadora -
"Spiltering Heart", "The Party" - é contraposta por uma
constrangedora, para uma banda que ainda estava associada ao progressivo -
"Cover My Eyes", "No One Can". Este é o lado A. O lado B é
melhor, mas não redime a porção exageradamente pop do disco. Até tem umas
comerciais de bela melodia, como "Dry Land" ou "This Town",
mas no geral é um passo em falso, não por ser pop, mas por ser pop pouco
inspirado. Se era para tentar tocar mais no rádio, que caprichassem nas
composições. Ouça marillion.com, de 1999, para comparar.
Brave
(1994) * * * *
Disse Hogarth
que perceberam o erro no disco anterior e deram uma guinada de 360 graus.
Apesar desse sentimento do músico, Brave não é o disco mais arriscado
que gravaram. Ao contrário, parece retomar o caminho iniciado com Seasons
End, atenuando a faceta pop que Holidays in Eden exacerbava. As
músicas voltaram a ser, em alguns casos, suítes, como em Misplaced Childhood.
A maior delas, "Goodbye to All That", também a melhor faixa do disco,
dura mais de 12 minutos e tem cinco partes. Talvez a banda tenha percebido o
sucesso do prog-metal d Queenryche em Empire e decidido que poderia
fazer um disco mais robusto, não bem prog-metal, mas certamente um prog mais estrondoso.
Fizeram com isso um belo disco.
Afraid of
Sunlight (1995) * * * *
Os três anos
que separam Brave de seu antecessor dizem muitas coisas, mas não tanto
quando o curto espaço de tempo entre Brave e Afraid of Sunlight. Este
último flagra a banda ousando mais ainda, buscando novas sonoridades além de
seu prog baladeiro, mas sem sair da trilha aberta com o disco anterior. Um
crítico da Q definiu assim a mistura: toques do legado de Brian Wilson, Todd
Rundgren e Beatles, com notas das trivialidades experimentais de Jellyfish e
Split Enz. Pior é que faz sentido, mas em poucas faixas. Como "Cannibal
Surf Babe", cruzamento inusitado entre Beach Boys, Split Enz e Can, uma
das composições mais ousadas da banda, no sentido de desafio aos fãs, e também
a melhor do disco. "Beautiful" é um dos maiores sucessos da banda, o
tipo de balada melosa que eles tentam fazer desde Clutching at Straws.
Desta vez acertaram em cheio. Entre as demais, a mais bela me parece ser a
faixa-título, melodia bem marilliana, balada prog de respeito. As duas faixas
acrescentadas no relançamento de 1999, "Icon" e "Live
Forever" são estupendas, belos exemplos de experimentação que engrandecem
o disco original.
This
Strange Engine (1997) * *
"Man of
a Thousand Faces" é a pior faixa de abertura de qualquer disco do
Marillion até então. Menos por ser uma balada comercial levada por violões e
teclado, mas pela melodia um tanto óbvia e genérica. A segunda, "One Fine
Day" segue o mesmo padrão, sendo só um pouco melhor. Na terceira, "80
Days", o nível volta a cair. A esta altura, precisaria melhorar muito nas
cinco faixas restantes para que o disco fosse meramente satisfatório. A quebra
com a EMI e um novo contrato para três LPs com a Castle deve ter mexido
inicialmente com a inspiração da banda, que aqui soa como um daqueles pops
genéricos dos anos 1990. Uma banda irreconhecível na maior parte do disco. Salvam-se,
ainda que em degraus abaixo dos destaques de discos passados,
"Estonia" e a faixa-título, único prog do disco, com 15 minutos e um
arranjo que inclui solo de saxofone. Belo encerramento para disco que abriu mal
e assim continuou por boa parte de sua duração. Felizmente, eles voltariam a
fazer belos discos logo em seguida.
Radiation
(1998) * * * 1/2
Bem mais
desafiador que o disco anterior. Radiation flagra uma banda de espírito
renovado, com desejo de seguir sempre em frente, sem se acomodar. "The
Answering Machine" é uma das melhores composições da fase Hogarth.
"Three Minute Boy" é uma das mais belas. "A Few Words for the
Dead" é a prog gigante (mais de 10 minutos) que eles sempre fizeram muito
bem. Por mais que o disco caia exageradamente nas baladas a partir da quarta
canção, as melodias continuam inspiradas como nas três primeiras, o que faz a
diferença.
marillion.com
(1999) * * * *
Terceiro e último disco do contrato com a Castle que se seguiu à saída da EMI, este belo trabalho de nome contemporâneo contempla uma banda que já se tornou rainha na confecção de um pop radiofônico e moderno, ajudados pela tendência dos anos 1990 de um pop mais pesado, próximo do metal. Com outro belo álbum em sequência, e este me pareceu ainda melhor que Radiation, eles praticamente se redimem do fiasco de This Strange Engine. A primeira música, "A Legacy", é uma boa amostra disso, e é das melhores do disco - embora seja das menos ouvidas, segundo as estatísticas do YT music. "Deserve" segue a mesma tendência, com uma levada bem moderna e agradável. É outra das melhores. "Rich" é outra das menos tocadas no YT e é bem pop FM, para ver como o Marillion não se dá bem com essas relações óbvias. "Tumble Down the Years" é pop perfeito, uma bela melodia. Aprenderam essa arte muito bem. O disco se encerra com duas faixas enormes. "Interior Lulu", cheia de variações, é melhor, mas "House", que parece saída de algum disco solo do Sting, também é notável.